Retomando o Modelo Divino na Prática da Evangelização.
- Rev. Ubirani Alves
- 10 de ago. de 2023
- 14 min de leitura

A sentença "Deus foi o primeiro missionário" ou "o primeiro evangelista" parece ter virado um clichê no meio missiológico. Não que as sentenças não sejam verdadeiras, mas foram tão utilizadas e repetidas que se tornaram uma expressão comum e previsível, muitas vezes perdendo seu valor original e impacto emocional. A oração "Deus foi o primeiro missionário" se tornou mais uma frase de efeito do que um chamado para olharmos mais detalhadamente o modelo divino para a evangelização.
Na verdade, tomamos essas sentenças como uma premissa, mas os modelos de evangelização que muitos de nós abraçamos não são o modelo bíblico, mas, antes, são: o modelo da autoajuda, ou seja, mostramos para a pessoa como ela é preciosa e esquecemos-nos de mostrar a terrível situação de pecado em que ela se encontra; o modelo catastrofista, no qual mostramos como o mundo está terrível, levantamos números de homicídios, de drogas, de desemprego, como se fosse esse o motivo para as pessoas se converterem; o modelo da prosperidade, no qual falamos que Jesus veio para mudar a situação da pessoa, isto é, sua vida financeira, familiar, seu emprego. Não que Deus não possa mudar tudo isso, mas a questão é que esse não é o motivo para que as pessoas se convertam, se arrependam de seu pecado e o abandonem.
Não à toa, vemos uma geração de cristãos tão ensimesmados, uma geração mais voltada para suas necessidades do que para alcançar o mundo perdido, mais preocupada em viver seus planos do que viver para a glória de Deus. Afinal de contas, eles foram evangelizados e ouvem com frequência que são o centro do coração de Deus, de Cristo.
Nesse breve artigo, trataremos do método divino usado para anunciar o Evangelho aos nossos primeiros pais, Adão e Eva. Logo após a queda, Deus desce na viração do dia para ter comunhão com eles, mas os encontra em estado de rebelião, afastados de Sua presença.
Adão e Eva estavam tentando cobrir a vergonha que a queda lhes trouxe, cobrindo sua nudez com folhas que coseram, pois perceberam que estavam nus. Essa é a primeira tentativa do homem de construir uma religião para lidar com o problema da queda. É a primeira solução humana para tentar lidar com o pecado. Depois, muitas outras foram erigidas, mas assim como a de Adão e Eva não serviam, as de hoje também não servem. Em meio a essa panaceia, Deus vem e proclama o Evangelho para Adão e Eva, pois só esse pode realmente curar por completo o pecado e seus males.
Estou convencido, pelas Escrituras, de que a maneira como Deus evangelizou Adão e Eva é a que devemos usar hoje, pois o problema ainda é o mesmo: o pecado, e a humanidade ainda hoje, assim como Adão e Eva, procura erigir a cura por meio da religião, do cientificismo.
Logo, se o próprio Deus desceu no jardim do Éden para buscar os que haviam se perdido e com isso deixou um modelo para copiarmos, por que não retomarmos o modelo divino na prática da evangelização?
1. Uma Verdade Implícita.
Quando Deus desceu ao jardim pela viração do dia (Gn 3.8) buscando manter comunhão com Adão e Eva, algo se apresentava diferente. O homem e a mulher se ocultaram da presença divina, revelando uma mudança profunda. Deus então chamou pelo homem e questionou: "Onde estás?" (Gn 3.9), marcando o início de um diálogo. O homem respondeu que, ao ouvir a voz de Deus, experimentou medo, pois estava nu e se escondeu. Deus, por sua vez, direcionou mais duas perguntas ao homem: "Quem te fez perceber que estavas nu? Comeste da árvore da qual te ordenei que não comesses?" (Gn 3.11).
Essas perguntas desnudaram a transgressão de Adão e Eva, uma vez que a vergonha que sentiram por sua nudez revelou a sua desobediência a Deus. O Senhor havia estabelecido uma ordem para o homem: "... da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás" (Gn 2.17).
Este mandamento ganhava destaque como a essência da aliança entre Deus e Adão, conhecida como "pacto de obras" ou "aliança de obras". Dentro desse pacto, o mandamento relativo à árvore do conhecimento do bem e do mal assumia o papel de teste da obediência de Adão, revelando a sua submissão à vontade divina.
O mandamento desempenhava um duplo papel no contexto do pacto das obras:
1. Prova de Obediência Pessoal: O mandamento constituía um desafio de perfeita obediência por parte de Adão. Deus havia colocado diante dele uma escolha: seguir o mandamento e evitar o fruto proibido, ou desobedecer e consumir o fruto. Esse teste seria revelador da fidelidade e devoção de Adão à vontade divina, bem como sua prontidão em acatar as instruções de Deus.
2. Consequências da Desobediência: O mandamento carregava uma advertência clara: desobedecer resultaria em morte. Ao consumir o fruto proibido, Adão romperia o pacto de obras, enfrentando a morte tanto espiritual quanto física. A árvore do conhecimento do bem e do mal se transformava num símbolo tangível das escolhas feitas por Adão e das consequências que se seguiam.
Em resumo, o mandamento de não comer da árvore do conhecimento do bem e do mal ocupava um lugar central na busca da obediência perfeita no contexto do pacto das obras. Contudo, Adão falhou no teste, consumindo o fruto proibido e testemunhando as consequências ao sentir temor e se afastar da presença de Deus. A palavra hebraica usada por Adão para descrever esse medo é "yārē'" (יָרֵא), que traz consigo uma gama semântica abrangente, porém, no contexto, denota um receio avassalador diante da aproximação divina. Adão e Eva sentiram pavor pela aproximação de Deus após terem transgredido e desobedecido o mandamento.
Isso nos leva a uma questão intrínseca, uma verdade que não é explicitamente mencionada no texto, mas pode ser percebida facilmente: o direito que Deus tem de ser obedecido por Suas criaturas. O pavor sentido por Adão e Eva quando Deus se aproximou decorreu do entendimento de que eles deviam obediência a Ele, simplesmente por ser o Criador de todas as coisas. Ele detinha o poder de estabelecer mandamentos e emitir ordens às Suas criaturas. Como Criador, Ele possuía o direito de julgar a desobediência e impor a pena de morte. Adão já estava sob a sentença de morte devido à sua desobediência, e os primeiros efeitos dessa sentença já se manifestaram de maneira alarmante: eles morreram espiritualmente, como evidenciado pela sensação de culpa e pela alienação mútua, expressas pelo sentimento de vergonha por sua nudez. O clímax desse relato que atesta a morte é o medo que eles experimentaram diante da presença divina se aproximando do jardim.
Se quisermos retornar ao paradigma divino para evangelizar, fica claro que todo ser humano, independentemente de quem seja, deve obediência a Deus. Essa verdade subjacente ao relato da queda deve ser proclamada pelos mensageiros da evangelização: Deus, como Criador, merece ser obedecido e honrado.
Na tessitura do cosmos, ecoa uma verdade indelével: Deus, Criador, merece nossa obediência e honra. Sua palavra deu vida ao universo; nossa obediência é a resposta à Sua grandiosidade. Essa verdade forma o alicerce da evangelização, e a igreja que busca evangelizar no modelo divino tem a responsabilidade de compartilhá-la, instruindo outros a reconhecerem a primazia divina.
A evangelização tem como objetivo levar as pessoas a reconhecerem que devem obediência a Deus. O fato de Ele ser o Criador impõe sobre nós, como criaturas, a obrigação de obedecê-Lo e prestar-lhe honra.
A verdade da criação revela que Deus, como Criador, detém o direito de estabelecer mandamentos e ordens, demandando nossa obediência. Ademais, Ele também possui o direito de impor punições diante da desobediência. Esta verdade é fundamental para compreender o estado humano, visto que após a queda, nenhum ser humano pode obedecer a Deus por completo.
2. Descrevendo o Verdadeiro Estado do Homem.
A pergunta inicial do diálogo entre Deus e Adão, "Onde estás?", transcende uma abordagem meramente geográfica. Dado que Deus é onisciente e onipresente, Ele não busca obter informação, mas sim desencadear uma reflexão profunda. Essa indagação vai além da localização física de Adão e Eva; ela destaca um padrão recorrente nas Escrituras (Gn 4.6-7; 1Rs 19.9-10; Êx 4.2; 16.4; Jz 6.13; Jó 38.2-3; 40.7; 42.4; Is 1.18; Jr 8.4; Ez 37.3; Am 2.14; Jn 4.4), onde Deus, ao questionar, visa promover uma ação.
Deus utiliza essa pergunta como um instrumento para que Adão reconheça sua própria condição e, consequentemente, se arrependa. É uma tática que visa estimular a reflexão sobre as ações e o estado do coração humano, do coração de Adão.
A narrativa sugere que a presença divina no jardim ao romper do dia era algo rotineiro, porém algo mudou. A chegada de Deus agora evoca medo em Adão e Eva, levando-os a se esconder. A pergunta de Deus não se trata de uma busca por informações, mas de um convite para que Adão reconheça a nova realidade de separação e distância.
O pecado de Adão introduziu uma divisão intransponível entre o homem e Deus. A tentativa de Adão de encobrir sua nudez com folhas de figueira reflete uma tentativa ineficaz de lidar com o pecado. O temor de Adão diante da aproximação de Deus demonstra a ruptura do relacionamento que antes existia.
O estado de desobediência resultante da queda tornou-se um abismo intransponível entre a humanidade e Deus. A pergunta de Deus, "Onde estás?", não somente serve para elucidar essa condição a Adão e Eva, mas também ressoa conosco, convidando-nos a reconhecer nossa própria natureza caída.
A Bíblia afirma que todos pecaram e estão separados de Deus (Rm 3.23). Essa separação não é meramente física, mas reflete a hostilidade inerente à natureza humana em relação a Deus (Ef 2.3). Esta pergunta divina nos lembra que nossa propensão ao pecado nos distanciou da plenitude do relacionamento com Deus.
Essa condição não se trata apenas de ações isoladas, mas é intrínseca à natureza humana. Como Paulo explica em Efésios 2.3, somos "por natureza filhos da ira". O medo que Adão e Eva sentiram ao se esconderem aponta para o fato de que, após a queda, a humanidade vive sob a sombra da justa ira de Deus.
Portanto, a pergunta "Onde estás?" não é simplesmente um pedido por para saber a localização de Adão e Eva, mas um convite à reflexão profunda sobre a condição espiritual, não só deles, mas também a nossa condição como seres caídos e a necessidade de reconciliação com Deus.
Ao evangelizar, os cristãos devem mostrar que o homem está, por seus próprios esforços, irremediavelmente distante de Deus. Não consegue obedecer-Lhe, e como deve obedecer, mas não conseguimos. Está em um estado de condenação.
Esse estado de condenação deve ser salientado; a condição de rebelião, onde o homem ama tudo que Deus odeia, é a real situação do homem. Quando Deus perguntou a Adão: "onde estás?", Ele queria mostrar isso. Logo, se quisermos usar Deus como paradigma da evangelização, essa não é uma mensagem que devemos passar por cima.
A importância de ressaltar a incapacidade do homem em se aproximar de Deus por seus próprios esforços e a dificuldade em obedecer aos Seus mandamentos, devido à profunda contraposição entre os desejos humanos e os princípios divinos, é sumamente relevante para a evangelização. Isso se deve ao fato de que o reconhecimento desse estado de distância e condenação é essencial para compreender a imperativa necessidade de redenção.
A apreensão das grandezas contidas nas Boas Novas somente ocorrerá quando o ser humano internalizar a profundidade da triste notícia do pecado.
3. A Solução Divina.
Se é impossível para o homem transpor, por seus próprios feitos, o abismo que o pecado lançou entre ele e Deus, e se é impossível para o homem reverter, por seus próprios méritos, a relação de inimizade entre ele e Deus, então o homem está irremediavelmente perdido? Se ele depender de si mesmo para sua salvação, sim, mas existe um meio que o próprio Deus estabelece. Ele deixa isso claro de duas formas em sua evangelização (Gn 3.8-24). A primeira é pela promessa em Gênesis 3.15: "Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar."
Deus promete que, por meio da descendência da mulher, será constituído alguém que desfará todos os males que o tentador trouxe por meio da queda do homem. Isso revela que o resgate do homem vem por meio de um de seus descendentes. No entanto, essa promessa não foi feita diretamente a Adão; foi pronunciada como uma maldição àquele que incitou o homem ao pecado.
A semente da promessa germinou um profundo sentimento de expectativa no coração do primeiro casal, alimentando a espera pelo nascimento de seu primogênito. Quando Caim veio ao mundo, Eva exclamou: "Com o auxílio do Senhor, adquiri um varão" (Gn.4.1). Poderíamos traduzir suas palavras como: “Adquiri um varão, o Senhor” Nessa afirmação, Eva transmitia a esperança de que a redenção se manifestasse através desse filho, uma vez que ela e seu marido tinham atentamente escutado as palavras dirigidas à serpente: "...o seu Descendente ferirá a tua cabeça...".
A narrativa bíblica não revela os detalhes íntimos da vida do casal original, porém, a promessa feita no cenário paradisíaco do Éden ecoou nas mentes de Adão e Eva com o nascimento de cada filho. Por essa razão, para o povo do Antigo Testamento, o nascimento de uma criança era um evento carregado de significado, pois reacendia a ardente esperança na vinda do prometido Libertador.
Através da compreensão da história providencial de Deus, sabemos agora que essa promessa estava direcionada a Jesus Cristo. É por essa razão que essa profecia é chamada de "O Proto-Evangelho", sendo a primeira entre todas as profecias que apontam para Jesus. Poderíamos até considerá-la como "a raiz de todas as profecias messiânicas".
Desse modo, o sinal inaugural da redenção brilhou na trajetória humana, reafirmando ao homem que, apesar do pecado, Deus estava comprometido em proporcionar a reconciliação. Essa é a essência de toda vida cristã e o epicentro da aliança entre Deus e a humanidade.
O ser humano, por sua própria natureza e esforços, está intrinsecamente limitado quando se trata de alcançar sua própria redenção. No entanto, é a partir da iniciativa compassiva e misericordiosa de Deus que uma notável transformação ocorre. Nesse solo árido e sombrio, marcado pela morte e pelo peso do julgamento, uma surpreendente semente de esperança é meticulosamente plantada.
Essa semente carrega em si uma promessa tão profunda e revolucionária quanto a própria história da humanidade. Ela é uma promessa de um Salvador vindouro, que, com sua obra magnífica, esmagará a cabeça da serpente, símbolo do mal e da maldição que permeiam o mundo. Essa promessa ecoa através das eras, ressoando por cada texto das Escrituras, como um hino de renovação e restauração.
Essa semente de esperança não apenas germina, mas também floresce em meio ao desolador cenário da vida humana. Ela não apenas promete a aniquilação das consequências do pecado, mas também a oferta de uma vida verdadeiramente abundante e eterna. A mensagem que essa semente traz é um convite à reconciliação, à redenção e à renovação completa de toda a criação.
A partir do solo aparentemente estéril da mortalidade e da condenação, emerge uma promessa que transcende os limites da humanidade. É uma promessa que não pode ser realizada por esforços humanos, mas que encontra sua expressão máxima na graça e na providência divina. É uma promessa que permanece como o pilar central da história da salvação, oferecendo esperança e transformação a todos que a acolhem.
Adão, o progenitor da humanidade, revela sua profunda confiança nessa promessa transcendental, deixando evidente o impacto que ela tem em sua visão de mundo. Essa confiança é notória quando observamos a ação significativa que ele toma ao nomear sua esposa. Ao dar a ela o nome de Eva (חַוָּה, Ḥávvāh), vida, ele não apenas a chama pelo que ela é, mas também projeta uma expectativa grandiosa para o futuro.
Esse gesto de Adão carrega um profundo simbolismo e uma visão esperançosa. Em meio à paisagem sombria e marcada pelo efeito do pecado, Adão escolhe deliberadamente chamar sua companheira de "vida". Esse nome não é meramente um termo, mas sim uma afirmação de fé na promessa divina e nas suas implicações transformadoras.
Nesse ato, Adão não apenas expressa sua fé, mas também deixa um legado profundo de esperança e expectativa para toda a humanidade. Seu gesto ecoa através das eras, lembrando a todos nós que, mesmo nas circunstâncias mais desafiadoras e sombrias, a promessa divina de redenção permanece firme. A ação de Adão em nomear sua esposa se torna um sinal eloquente da confiança que devemos ter em Deus, certos que ele vai cumprir Suas promessas e trazer vida e restauração a todas as coisas.
O segundo momento revelador da provisão divina para a questão do pecado ocorreu quando Deus cobriu a nudez de Adão e Eva. As vestimentas improvisadas pelos próprios indivíduos, fruto de sua consciência desperta para a transgressão, rapidamente se mostraram inadequadas para amenizar o impacto devastador do pecado em sua relação com Deus.
Nesse gesto de cobrir a nudez, Deus não apenas supriu uma necessidade física, mas também simbolizou o que viria a ser a redenção completa através de Seu Filho. Essa cena prefigura a verdadeira expiação que somente Cristo realizaria no futuro. O uso de peles de animais para fazer as vestes revela a antecipação de sacrifícios e a ponta para a cruz como o supremo sacrifício.
Ao se empenhar em ocultar sua vergonha por meio de suas próprias ações e méritos, Adão inadvertidamente dava origem àquilo que poderia ser considerado a gênese da religião. Essa busca por cobrir sua nudez e compensar sua transgressão reflete uma tendência humana intrínseca de lidar com a separação causada pelo pecado. A religião, de certa forma, emerge como uma resposta à profunda alienação que o pecado introduziu.
Entretanto, é no contraste entre a tentativa humana e a intervenção divina que a verdadeira natureza dessa relação é ressaltada. Deus, ao sacrificar um animal para prover roupas para Adão e Eva, estava não apenas oferecendo uma solução prática para sua exposição, mas também delineando um padrão futuro de redenção. Esse ato profético apontava para a maneira pela qual Deus resolveria o dilema humano: por meio de um sacrifício supremo, representado por Seu próprio Filho.
O sacrifício animal prenunciava o sacrifício de Cristo na cruz, que remediaria não apenas a nudez física, mas também a separação espiritual do homem de Deus. Ao invés de Adão depender de suas próprias realizações, a ação divina destaca a insuficiência das obras humanas e a necessidade de uma intervenção divina mais profunda. O Filho de Deus se tornaria o verdadeiro sacrifício, cobrindo-nos com uma veste de redenção, permitindo que nos aproximemos da presença de Deus com confiança e reconciliação.
A obra redentora de Cristo na cruz transcende o âmbito terreno e mergulha nas profundezas da teologia da salvação. A cruz não é apenas um símbolo de martírio, mas o ápice de um plano divino meticulosamente arquitetado para reconciliar a humanidade consigo mesmo.
Ao entregar-se como o Cordeiro de Deus, Cristo não somente expia nossos pecados, mas inaugura uma nova ordem na relação entre Deus e o homem. Sua morte vicária é a expressão máxima da justiça divina sendo satisfeita, e a misericórdia de Deus derramada sobre a humanidade caída. A veste que Ele nos concede é mais do que um símbolo; é a imputação da sua própria justiça sobre os crentes, uma troca gloriosa onde nossa indignidade é substituída por Sua perfeição.
Essa cobertura é uma união vitalícia com Cristo, uma participação na Sua morte e ressurreição. Por meio dela, somos capacitados a nos achegar à presença de Deus com confiança, não baseados em nossos méritos, mas na justiça imaculada de Cristo que é creditada a nós por fé. Assim, a redenção não é apenas um ato isolado, mas produz uma transformação interior contínua, uma vida vestida em santidade e separação do pecado.
Esse deve ser o ponto culminante de uma evangelização Teocêntrica e Teo-orientada. Em outras palavras, uma evangelização que tem Deus como o centro e o orientador principal. Se desejamos espelhar Deus em nosso esforço evangelístico, é essencial concluir com a proclamação do Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Assim, estamos convidando as pessoas a adotarem a mesma atitude que Adão teve ao meio da morte do pecado: crer na vida trazida pela Semente da Mulher, que é Cristo.
Portanto, retomar o Modelo Divino na prática da evangelização é mais do que um mero retorno a conceitos antigos; é uma jornada em direção à essência transformadora da mensagem cristã. Nossa evangelização deve transcender as fórmulas gastas e abraçar a profundidade das verdades subjacentes ao relacionamento humano com Deus.
Da mesma forma que Deus buscou Adão e Eva no jardim, convidando-os a confrontar sua própria condição e necessidade de redenção, nós também devemos ousar questionar aqueles a quem compartilhamos o Evangelho. Não para acusar, mas para convidar à reflexão profunda sobre a própria humanidade, a distância que o pecado criou entre nós e Deus, e a necessidade urgente de salvação.
A promessa do Descendente da Mulher, que esmagaria a cabeça da serpente, deve ecoar em nossas palavras e ações evangelísticas. Pois, assim como Adão e Eva ansiavam pela vinda daquele que redimiria a humanidade, nossos corações devem pulsar com a expectativa do retorno glorioso de Cristo, que cumprirá plenamente essa promessa e restaurará tudo o que o pecado arruinou.
A mensagem da cruz deve ser proclamada com fervor e compaixão, transmitindo a esperança de que, em meio às nossas inadequações e distâncias, há uma solução divina que nos resgata do abismo do pecado. A expiação de Cristo, o sacrifício perfeito que cobre nossa nudez espiritual, deve ser comunicada como a âncora da nossa redenção. Assim como Deus proveu vestes de pele para Adão e Eva, Ele providenciou o Cordeiro perfeito, cujo sangue nos purifica de todo pecado.
Ao retomar o Modelo Divino na prática da evangelização, estamos convocados a apresentar a verdade completa do Evangelho. Reconhecer a soberania de Deus sobre nossas vidas, aprofundar a compreensão da nossa própria condição de pecadores necessitados e celebrar a graça salvadora de Cristo que nos reconcilia com Deus. Essa não é apenas uma chamada para reexaminar métodos, mas para reviver a mensagem transformadora que, desde o Éden até o Calvário, aponta para a esperança eterna encontrada na cruz de Cristo.
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