O “Culto” Virtual não Pode Ser Considerado Culto Solene

Quero começar dizendo que esse texto não é uma crítica ao que muitas igrejas hoje estão fazendo, pois no contexto em que vivemos não podemos ficar sem a palavra de Deus e devemos lançar mão de todo recurso lícito para que a palavra do Senhor chegue às ovelhas que ele comprou com seu próprio sangue e ao mundo. Também não é uma crítica ao uso da palavra culto para falar dessas nossas transmissões pela internet e rede sociais, pois entendo que essas transmissões são essenciais em momentos como esses e para que a igreja entenda tal importância muitos, inclusive nós, chamamos de culto online.

Dito isso deixe-me corrigir alguns erros: O primeiro erro é achar que pelo simples ato de nomear uma reunião, seja ela presencial ou online, de culto torna tal reunião um culto solene. Isso é um erro, pois o culto solene tem a sua própria natureza que o define como tal, logo, qualquer reunião para ser um culto solene precisa possuir os elementos que o define. O Segundo erro é achar que por não podermos nos juntar solenemente tal reunião online ou culto online substitui o culto solene. Esse pensamento erra no fato de achar que a definição de culto se dá pela circunstância, ou seja, não podemos nos reunir no dia do senhor presencialmente vamos fazer online para substituir a altura o culto presencial. Porém não é a circunstância que define o culto, mas como já falamos o culto solene tem sua própria natureza, mesmo sendo importante estarmos transmitindo a palavra de Deus online e mesmo que chamando de culto, isso não torna tal atividade culto solene propriamente dito.

I. A Natureza do Culto.

Entender a natureza do culto é tão importante que o segundo mandamento (Êx 20.4; Não farás para ti imagem de escultura, nem semelhança alguma do que há em cima nos céus, nem embaixo na terra, nem nas águas debaixo da terra) trata justamente de como devemos cultuar a Deus. Se o primeiro mandamento (Êx 20.3; Não terás outros deuses diante de mim.) fala da relação de Deus com seu povo em todas as áreas da vida o segundo fala da relação cúltica de Deus com seu povo.

Conhecer a natureza do culto solene nos ajuda a não oferecer a Deus um culto antropocêntrico, ou um culto caricato e assim corrermos o risco de estarmos adorando não ao Deus bíblico, mas a deuses criado a nossa imagem e semelhança. Também nos impede de achar que toda reunião que a igreja faz é culto. Uma vez que existiam várias atividades diárias no tabernáculo e posteriormente no templo como o holocausto, a oferta de manjares e oferta pacífica (Lv 1.1-3.17). Essa era ofertas voluntárias e nenhuma é chamada de santo ajuntamento, ou santa convocação. A Santa Convocação era realizada no sábado (Lv 23.3) ou em alguma comemoração especial.

Na santa convocação todo povo deveria comparecer, pois era santo culto da aliança. Isso mostra que mesmo havendo várias atividades no templo e anteriormente no tabernáculo o santo ajuntamento era singular e obrigatório, logo, o culto era e ainda é diferente de todas as atividades da igreja, tanto na antiga como na nova aliança.

1.1. Definição.

A vocábulo culto vem do latim cultus que significa um conjunto de atitudes e ritos pelo qual um grupo de fiéis adora ou venera a divindade. No grego neotestamentário o termo mais comum para o culto a Deus é λατρεια (latreia) quando ela não é traduzida por culto é traduzida por serviço sagrado. A septuaginta (versão grega do Antigo Testamento) traduz latreia por rito. No hebraico não existe nenhuma palavra equivalente para culto. Mas em Rm 9.4 (São israelitas. Pertence-lhes a adoção e também a glória, as alianças, a legislação, o culto [latreia] e as promessas) Paulo mostra que havia sim um culto no Antigo Testamento e esse era chamado de מִקְרָא־קֹ֔דֶשׁ (miq · rā- qō·ḏeš), santa convocação ou santa assembleia.

Mesmo não havendo uma definição formal, pois dificilmente a Bíblia se propõe a definir os termos que ela usa, uma análise simples dos termos encontrados nela nos mostra que há uma certa continuação entre מִקְרָא־קֹ֔דֶשׁ (miq · rā- qō·ḏeš) usado no AT com o λατρεια (latreia) usado no NT e o nosso Culto que vem do latim cultus.

A Natureza do Culto não mudou mesmo em épocas e culturas diferente, pois o que define o santo culto é o fato dele ser instituído e prescrito por Deus em sua palavra.

1.2. O Culto é um Ajuntamento Presencial e Solene.

O culto é uma convocação de Deus ao seu povo (Êx 23.12; Lv 23.3) para que esse povo se junte diante Dele (Sl 50.5; Is 1.13) e nesse ajuntamento eles possam seguir o ritual estabelecido pela palavra de Deus, ou seja, participar dos elementos do culto que foram prescritos pelo Senhor. Em 1Co 14.26 quando Paulo instruiu os coríntios sobre o culto ele diz: Quando vos reunis, ou seja, o ajuntamento é uma parte essencial do Santo Culto, sem ajuntamento do povo de Deus não pode haver culto solene.

Ainda na primeira carta aos coríntios ao se referir a igreja local Paulo diz que ela é o santuário e habitação de Deus (1Co 3.16-17), sabemos que Deus não habita em prédios (At 7.48-49), logo Paulo está se referindo ao ajuntamento da igreja, quando a igreja local se reúne, ali está a habitação do Deus vivo, e é no contexto de ajuntamento que Deus habita em meio aos louvores do seu povo, ou é entronizado entre os louvores de Israel (Sl 22.3).

Não vamos nos deter mais na natureza do culto, pois teríamos muitos outros pontos para tratar como os próprios elementos do culto. Mas entendo que esses dois pontos já nos deixam claro o nosso intuito de mostrar que o culto deve ser presencial onde o povo de Deus de determinada igreja local se reúne em uma localidade para servir a Deus em adoração seguindo os elementos que a Bíblia prescreve para o santo ajuntamento.

2. O nosso sentimento diante de tudo isso.

Devemos entender que por alguma razão Deus em sua providência quis nos privar temporariamente do culto solene e público. Assim, devemos estar cônscios que Deus em sua infinita sabedoria sabe o que está fazendo e com certeza está fazendo o melhor para sua igreja.

As reuniões ou culto online deve ser acompanhado pelos irmãos, pois todos somos carentes de ouvir a palavra de Deus, essa não é a forma ideal, mas é a maneira que dispomos para ouvir nesses dias.

Deve haver um senso de gratidão entre nós, pois mesmo sendo privados do culto público Deus não nos privou de sua palavra pregada, então orem pelos ministros que durante a semana e no dia do Senhor estão nos ministrando a palavra de Deus. Mas ao mesmo tempo irmãos não se conforme em estar longe do ajuntamento solene, não achem que essas reuniões substitui o santo culto.

Orem para que esses dias sejam abreviados conforme a santa vontade do nosso Deus, para que essa privação nos leve a amar mais o santo culto. Chorem! Pois esses dias são dias de pranto e não de alegria, fomos privados da santa convocação.